Soft porn: Cinquenta tons de cinza

O sucesso de Cinquenta Tons de Cinza não me ofende. 340 mil pessoas compraram a edição brasileira e ninguém as obrigou a isto. Certamente alguém que nunca comprou um livro, adquiriu o volume para encher a imaginação com suas fantasias SM e, creio eu, gozarem sem culpa.

Afinal livro é chique. (Quadrinho é que é sujo.)

A EL James faz agora o quê Harold Robbins e Sidney Sheldon fizeram uma geração atrás. Robbins, que tinha títulos como “O garanhão” chegou a ter volumes traduzidos por Nelson Rodrigues para dar ao leitor o “tom” da obra. Detalhe: o dramaturgo não tinha conhecimento algum da língua de Shakespeare e apenas assinava as traduções.

No fundo voltamos à questão primordial: leitores de “Harry Porter” continuaram a ler livros depois da série? Ou na narrativa contaminada do livros e filtrada pela cine-série apenas viciou os leitores infanto-juvenis?

Noto claramente que todo o contexto de “revolução dos duendes escravos” da série do menino-mago nunca foi um tópico muito distinto de debates, assim como o fato atual que uma garota aceita ser submissa numa relação romântica e sadomasoquista não vai acender a luz vermelha de ninguém, para transferir para o romance a responsabilidade de transformar as mulheres em objetos submissos. Ninguém realmente liga para o livro que rendará quando muito uma experiência sexual com menor culpa.

O melhor de tudo é que depois dos três livros, dos três filmes (sim, eles virão, espere) e passados dez anos ninguém irá se lembrar. Nenhuma mãe daqui dez anos irá entregar à filha a sua cópia do livro, com a mesma tranquilidade que passo para minha filha um Jules Vernes. Se as cópias ainda existirem nesta época, ficarão em algum lugar sujo e empoeirado como “cabe” ao soft porn que lemos na adolescência e temos vergonha de ter lido.

No mais, o desejo aceso irá encontrar uma recepção em muitos maridos, que irão locar produções soft porn para abastecer o manancial de expectativas criadas. Alguns apenas trarão para o quarto do casal as produções habituais que já assistiam, mas tinham vergonha do fato. A indústria do porn irá criar novas produções e assim um produto supostamente cultural irá criar uma geração de consumidores de pornografia.

Não a culpa não é de James, nem das editoras, nem dos leitores, mas todos usam o contexto, o mercado e as necessidades do público para ter lucros.

Grandes lucros.

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post scriptum: Ninguém fala, mas o grande objetivo por trás de toda a indústria de robôs é a pornografia. Robôs com pele, cheiro e aparência humana serão comercializados como bonecos infláveis e terão modelos criados sob encomenda para necessidades bem específicas. A ficção científica se não trata deste assunto de forma mais explícita é por que os editores querem ver livros que seus pais tenham orgulho e leiam.