A outra história do Universo DC (Panini, 2022)

Publicada pelo selo Tarja Preta (Black Label) da DC Comics e escrita por John Ridley, roteirista ganhador do Oscar, “A outra história do Universo DC” passa a impressão de anacrônica e esta é a sensação que fica quando terminamos sua leitura. Sabemos que é errado um homem adulto recrutar uma criança para atrair os tiros de criminosos enquanto ele esmurra alguns, mas hq é escapismo, não é?

A trama em cinco capítulos narra as vidas de Jefferson Pierce, o Relâmpago Negro; Karen Beecher-Duncan & Mal Duncan; Katana; Renee Montoya e Anissa Pierce, a Tormenta. O recorte é contar a história deste universo ficcional sobre o olhar destes personagens que são membros de minorias. Jefferson é professor e negro; Karen & Mal, são jovens negros; Katana uma japonesa; Montoya é filha de imigrantes latinos e lésbica e Anissa é filha de Jefferson, negra e lésbica. O uso de Anissa é um recurso interessante para dar uma ideia de ciclo à história: Anissa passa por problemas semelhantes ao de Jefferson além de ter que enfrentar um pai autoritário, mas excessivamente cristão para admitir a homossexualidade da filha. Jefferson destruiu seu casamento e se afastou de todos. Mal Duncan parece o eterno adolescente sem rumo se espelhando nos outros. Karen a gênia que se enamora com um homem que nunca chegará a lugar algum. A trama de Katana foge um pouco do padrão, mas serve para dar vazão às perseguições aos orientais, alguns nascidos na América. E os dois episódios finais tratam muito sobre os relacionamentos pai e filha acerca de temática da aceitação da sexualidade, ainda que no episódio de Montoya pouco espaço dê para seu pai e muito a como Montoya se vê.

 


Ridley tem ótimas ideias sobres os ricos, a criminalidade e a polícia de Gotham City, o relacionamento de Superman e Supergirl – a menina ao chegar à Terra é enviada para um orfanato! -, os vícios e a sexualização de alguns personagens secundários (Dick Grayson e Roy Harper são alvos constantes de todos), além de condenar o tratamento que vilões tem no universo DC, assim como a postura dos personagens em relação ao crime de nível de rua. Tudo é pouco sutil e bate fundo no leitor, incomodando e fazendo refletir sobre as ilusões que eventualmente temos sobre os personagens. Ridley não oferece uma “nova visão”, pois nós, cínicos já lemos por demais “novas visões”, mas sim uma visão engajada, incômoda; mas é pouco provável que o leitor não se sinta próximo de alguma narrativa em especial.

Para mim o incômodo maior foi a arte de Giuseppe Camuncoli e Andrea Cucchi. Em nenhum momento parece ser uma arte original. Camuncoli, certamente obedecendo a determinações editoriais reproduz um sem número de capas, artes promocionais e páginas de eventos importantes do Universo DC, algo que exigiria um desenhista mais competente que ele ou, ao menos, liberdade para criar. Algo que não ocorre. Assim, a obra que tem um grande impacto no texto que incomoda e faz refletir, mostra uma arte que parece apenas a imitação de dezenas de artes de artistas mais completos. Isto teve um grande impacto em minha leitura da obra: é boa, às vezes excelente, mas a arte a diminui.

Panini Comics, 2022. 256 páginas. ISBN 978 6559 604 975.