Durante anos as graphic novels foram prisioneiras do modelo do “herói narrador”: para falar da fome levavam o Superman ou o Batman que se sensibilizavam e, por extensão, sensibilizavam o leitor. Bill Sienkiecwz já criticou este modelo em uma palestra aqui mesmo no Brasil nos anos 1990.
Isto influenciou toda uma
produção de quadrinhos que sempre mostra os enredos com heróis ou
narrativas que mostrem as pessoas enviadas em atos heróicos. Note
que isto afeta até mesmo as narrativas de produções como Fábulas
e Hellblazer, teoricamente distantes do modelo. Mesmo Y O
último homem é uma versão da odisseia do herói em busca de
uma solução, uma cura, um deus ex-machina para salvar o
mundo. É bom dizer que este modelo não é necessariamente bom ou
ruim, apenas extremamente repetitivo.
Jesus Punk Rock de
Sean Phillips é uma grata surpresa porquê rompe com isto. É
verdadeiramente uma história que poderia receber rótulos como
ficção científica ou cyberpunk. Não é nenhuma
delas, podendo, no entanto, ser um misto.
A história parte de uma
premissa inovadora: clona-se Jesus Cristo a partir do Sudário de
Turim para um reality show. O responsável pela segurança do
empreendimento é um ex-membro do IRA, que como parte da população
mundial vê o programa J2 como a segunda vinda! Neste interim a
série já dá espaço para os questionamentos de moralidade da
clonagem, da exploração da vida pelos reality shows, além de todos
os questionamentos religiosos sobre o Sudário, sobre Jesus, sobre
aquilo que é belo para as massas.
O simples fato de não
ter vilão (até o momento, advirto, ou seja, as edições #1 e 2) e
ter um anti-herói como personagem principal, cujas experiências na
Irlanda são narradas em poderosos flash-backs, torna a série
melancólica e extremamente violenta. Visualmente este segurança é
muito semelhante à Frank Castle, o Justiceiro da Marvel Comics, o
quê pode tornar a série mais palatável para os gostos viciados em
quadrinhos de heróis.
Ou detalhe curioso que é
a segunda série VERTIGO que trata de um reality show e é publicada
em preto & branco. A primeira foi uma edição especial de
Hellblazer lançada no ano passado (veja aqui). Diferente das
narrativas habituais dos quadrinhos, Jesus Punk Rock é uma história
que certamente lembra literatura e que impressiona não por explosões
e cores vibrantes, mas por apostar em um roteiro ousado e antevê
questionamentos interessantes ao leitor.
Jesus Punk Rock de Sean
Phillips, minisérie em seis partes, mensalmente em Vertigo da Panini
Comics a partir da edição #40.