Nos
últimos anos tenho tido um cansaço especial com os quadrinhos
enquanto mídia em função de seus temas: o quadrinho de super-herói
cansa, especialmente se você o lê há mais de trinta anos como eu.
Torna-se
cada dia mais comum deixar de acompanhar séries de personagens para
acompanhar autores. Troco facilmente o lote de histórias do
kryptoniano produzidas por John Byrne e Dan Jurgens,
pelo lote de Grant Morrison. São gostos, é claro.
O certo,
no entanto, é que a repetição de acontecimentos e de estratégias
afasta o leitor. Qual a diferença entre The
New 52 para Marvel NOW?
Então,
às vezes penso que Alan Moore é apenas um velho gagá com
ego inflado, para então acordar e ver que o mago inglês tem razão
quando disse que todas as histórias já foram contadas e o talento
reside em contá-las de novo para uma nova audiência.
Assim é
Noé, Livro 1 Por causa da maldade dos homens (tradução
livre de Noé Tome 1 Pour la cruauté des hommes, álbum publicado na França por Le Lombard em
2011) de Darren Aronofsky & Ari Handel e arte e cores
de Niko Henrichon.
O livro,
que tenciona ser o primeiro de quatro, reconta a história clássica
– e bíblica – de Noé, um homem justo em uma sociedade
profundamente corrompida que é avisado pelo criador que o mundo será
purificado através de uma grande inundação. Caberá a Noé um
papel de salvar os justos e os animais com a construção de uma
arca.
A
história nas mãos competentes deste trio torna-se uma narrativa
apocalíptica e um cenário de sci-fi bem construído e condizente
com muito da produção da revista Heavy Metal ou dos
Humanóides Associados. Há evidentemente um tom ecológico na
trama, sem, no entanto, ser piegas, chato, eco-xiita ou pretensioso.
Noé é, acima de tudo o ecologista mor da humanidade, já que
resgatou os animais de uma grande catástrofe natural, permitindo a
sobrevivência dos mesmos enquanto os atos dos homens provocaram o
seu fim.
De
acréscimo há uma simpática reformulação do conceito de serafins
caídos, que nós, criados na cultura judaico cristã,
automaticamente atribuímos aos demônios e suas hordas; mas aqui são
retratados de forma original: por escolha própria caem para ensinar
ao homem a ciência e são vítimas do mau uso deste conhecimento. No
livro os serafins tornam-se os gigantes várias vezes referidos no
Pentateuco.
A única
crítica fica por conta do pouco desenvolvimento da família de Noé,
o quê se diga de passagem é bastante condizente com o papel da
mulher e dos filhos no contexto da sociedade retratada na Bíblia. A
esposa entra muda e saí calada e aceita todo o radicalismo do
esposo.