O Quarto Mundo de Jack Kirby

No início dos anos 2.000 a Brainstore Editora brevemente teve os direitos de várias séries da DC Comics que estavam espalhadas por várias editoras-tradutoras e publicou nove edições da série DC Millenium, um mix que reuniu Impulso, Novos Deuses e graphic novels ligadas ou não ao selo ElseWorlds.

A série foi interrompida antes de ampliar sua linha – prometia Legião dos Super-Heróis e O poder de SHAZAM! para a edição seguinte.

Um dos destaques foi a publicação de New Gods #12-15 e Jack Kirby's Fourth World #01-10 e 20 produzidos por John Byrne.

A sintese da trama apresentada é que Apokolips e Nova Gênese, os planetas antagonistas, foram fundidos e os Novos Deuses não se recordam dos motivos, voltando a se associar com os humanos que estiveram presentes na primeira série New Gods (1971) desenvolvida por Jack Kirby. Basicamente um “retorno ao básico” antes de apresentar o novo problema para os personagens.

Por sinal, Byrne concentra-se em Orion, Magtron, o Povo do Amanhã – pouco trabalhado no Brasil, especialmente quando se fala em O Quarto Mundo -, Pai Celestial, Darkseid e seus novos deuses do mal. Jimmy Olsen aparece apenas na edição 20publicada antes, mas se passando em um período cronológico distinto, por sinal a última edição da série – e Sr. Milagre e Grande Barda não passam de meros coadjuvantes.

Com os bons resultados a DC Comics decidiu cancelar a série New Gods e relançar o título como Jack Kirby's Fourth World, que iniciou o desenvolvimento de um plot que levaria à Genesis, um dos mega eventos boçais da editora, publicado em outubro de 1.997 (Jack Kirby Fourth World #10 é parte do cross-over) e relativamente inédito no Brasil, já que a minissérie não foi publicada por aqui e apenas um ou outro cross-over.

Muita gente comenta que Genesis é tão ruim que não vale o nanquim gasto na série.

Entre idas e vindas descobrimos que uma energia que permitiu a criação dos deuses e é comum a todos os planetas estaria retornando à Fonte e uma série de deuses e semi-deuses desejam a energia para si. Uma das tramas intermediárias é exatamente o resgate de Thor por Tigra, para utilizá-lo em sua vingança contra Darkseid. Isto leva a resgatar Odin fundido à Muralha. Apesar que criar um Thor visualmente bem distinto do personagem da Marvel, Byrne faz um Odin muito semelhante ao personagem da editora rival.

Há uma certa ironia aí. Quando Kirby criou o Quarto Mundo que surgiu após a destruição de um mundo anterior, muita gente entendeu que Nova Gênese e Apokolips haviam surgido das cinzas de Asgard, terra dos deuses nórdicos e palco da série The Mighty Thor da Marvel Comics. Ao apresentar tramas em que mostram os asgardianos presos à Muralha e também sendo atacados por Darkseid para reaver restígios de energia da Fonte, Byrne sutilmente confirma que uma série é o resultado de uma possível continuidade da outra: quando Asgard cair definitivamente irá surgiu uma nova geração de deuses, bons e maus.

Na citada edição #10, Pai Celestial se une a alguns deuses e atravessa a Muralha – que está se fragmentando – mas é assassinado à traição por Ares, que desejava o poder para si. Sim, este Ares é o mesmo personagem comum da série da Mulher Maravilha, na qual Byrne também trabalhou e explorou personagens de Kirby, como O Demônio e Darkseid – que atacou a Ilha e assassinou milhares de amazonas, uma forma de mostrar os ataques do deus do mal a outros panteões buscando a energia da Fonte.

O resultado de Genesis é que os planetas fundidos se separam e Darkseid, em sua busca de poder novamente é fundido à Muralha, o quê é claro não duraria muito.

[Mudanças]
→ conhecemos Christine Pequena, filha de Oberon;
→ Tigra, mãe de Orion e segunda esposa de Darkseid, afirma que Orion não é filho do regente de Apokolips. A pedido de Walt Simonson, Byrne deixou a pergunta sem resposta quando encerrou a série, e a trama continuou no título Orion.
→ Em histórias de suporte conhecemos a “origem” de Darkseid, uma banalidade que explora conceitos bons, mas afirma que os deuses de Apokolips e Nova Gênese tem uma identidade anterior e só depois ascendem à natureza definitiva de deuses.
→ Um relutante Scott Free (o Senhor Milagre), herda Nova Gênese em função da morte de Pai Celestial;
Takion, jovem cego terrestre que passou a ter acesso direto à Fonte, graças à interferência de Pai Celestial é apresentado aos leitores brasileiros. Entra mudo e sai calado, sem demonstrar nenhuma utilidade real.

[Defeitos]
Apesar de profundamente baseado no excelente trabalho de Jack Kirby em New Gods (1971) e desconsiderando o material de Mark Evanier ou Steve Englehart, a série apenas evidencia a fraqueza de John Byrne na produção de diálogos, geralmente redundantes ou descritivos demais. Algo bem anos 1960/70, época da produção da primeira série. Nota-se claramente que não é uma homenagem, mas um estilo de narrativa que já não tinha espaço no mercado em 1.997/98, época da série.

A trama em si não tem um desenvolvimento claro e o leitor só fica com a sensação que cada edição é produzida com “um mistério” seguido de mais uma dezena e meia de páginas de batalha.

Fãs do autor iram se deliciar com a arte – muito adequada – mas a leitura do material pode desestimular a acompanhar o desdobramento mais interessante, que é a série Orion de Walt Simonson.