Rico
com os lucros de ASILO ARKHAM Grant Morrison resolveu
viajar pelo mundo e experimentar drogas e narrativas confusas,
entremeadas de delírios e com uma trama geral que visivelmente se
perde no caminho. Assim pode ser definido os três volumes americanos
da série THE INVISIBLES, e tanto por entusiastas como por
detratores, está definido entre um dos mais interessantes trabalhos
publicados pela indústria mainstream de quadrinhos americana
ou como um cansativo delírio regado a drogas.
Escolha
a sua opção e saiba que não existe caminho certo.
Morrison
experimenta demais. Os experimentos em PATRULHA DO DESTINO são
fichinha perto dos experimentos de OS INVÍSIVEIS. Nem sempre
acerta, mas mesmo quando o faz, nesta série não produz um material
de fácil compreensão, e nem o seria, dado o estado em que o autor
estava quando criou a obra. Em momentos à frente será possível
entender a função do editor, que limita o campo de ação de
Morrison e tenta indicar a ele um caminho, daí a tentativa de um
reinicio no volume 2… e em um volume 3!
OS
INVISIVÉIS: REVOLUÇÃO, encadernado da PANINI COMICS
reúne oito números da série americana THE INVISIBLES volume 1
e ainda uma história curta de ABSOLUTE VERTIGO. Em BEATLES
MORTOS (#1) somos apresentados ao revolucionário KING
MOB – um alter ego de Grant Morrison até na aparência – que
coordena uma célula do grupo autointitulado OS INVÍSIVEIS e
confronta criaturas que dominam o mundo.
Estas
criaturas desejam a diminuir a resistência e criar um estado de
uniformidade e, a partir disso, o completo controle social. KING MOB
liberta DAVE McGOWAN, feito prisioneiro, ao mesmo tempo em que
percebemos que está iniciando um novo ciclo (final?) nesta guerra.
O
primeiro arco NA PIOR ENTRE CÉU E INFERNO (#2-4) trata
do treinamento de McGowan e sua descoberta de novas percepções de
realidade e mundos dentro de mundos. Depois de Neil Gaiman (em
especial LUGAR NENHUM, mas também DEUSES AMERICANOS) e
China Mieville não posso dizer que isto seja ao menos
chocante. Narrativas construídas sobre o conceito de “cidade por
trás da cidade” já perderam o impacto, exceção feita aos
neófitos. Em 1994, no entanto era conceito novo, creio – mas
alguém sussurou “Um conto de duas cidades” de Charles Dickens,
hum…
O
próprio conceito geral de que a realidade nada mais é do que uma
percepção do existente já foi adequadamente mostrado na trilogia
cinematográfica MATRIX, que sempre foi relacionada com Os
Invisíveis, no sentido de que acusam de plágio. Formalmente nada,
mas há relação evidentes entre as obras.
ARCÁDIA
(#5-8) também não colabora com o leitor, nem torna as coisas mais
fáceis. A célula de agentes que temos contato vai ao passado para
resgatar O MARQUES DE SADE e se percebe perseguida no presente –
eles viajam em um transe e seus corpos ficam no presente exposto a um
assassino que domina corpos, semelhante em termos, àquilo que
veríamos em MATRIX anos depois – e no passado, onde encontram
confusos agentes que obedecem a um artefato que fala exatamente
aquilo que eles esperam ouvir: ordens!
Morrison
atira em tantas direções, relacionando células ancestrais de OS
INVISÍVEIS ao iluminismo francês, à Revolução, assim como os
vilões aos TEMPLÁRIOS e à cabeça de JOÃO BATISTA, aqui o
“tesouro” escondido. Se não foi original, afinal cabeça
falante, por cabeça falante eu prefiro a de Orpheus, foi uma saída
inteligente para justificar ordens cumpridas de modo torto, pois eram
fornecidas assim, pelas metades.
Neste
arco há espaço para personagens secundários além de King Mob e o
novato Dave. LORD FANNY rouba parte da cena ao incorporar
deuses de civilizações pré-colombianas, mas neste caso, parte da
magia se perderá quando o leitor descobrir que Fanny não é
mexicano, nem de nenhum país da América Central (Olhe um pouco
abaixo no mapa). BOY treina McGowan e participa do tour
de Mob e Sade, sem acrescentar muito como personagem à trama e
RAGGED ROBIN tem uma passagem interessante na trama, mas
nenhum desenvolvimento efetivo como personagem.
Ao
resgatar Sade para auxiliar na criação de um futuro para a
humanidade a série aponta numa direção que não seguirá; pelo
contrário. Hermética demais nas histórias iniciais a série se
aproximará – muito pouco, admito – da narrativa padrão com o
passar dos números. Haverá espaço inclusive para arcos centrados
nos personagens, nas suas motivações e na solução da grande
conspiração.
Ao
ler a edição fica, evidentemente, a saudade de quando a VERTIGO
era tão pouco comprometida com vendas e dava espaço para seus
autores fazerem o que quisessem. Serem realmente inovadores. Em 1994
mesmo tendo vendido muitos exemplares de ZENITH, HOMEM-ANIMAL,
PATRULHA DO DESTINO, FLEX MENTALLO e ASILO ARKHAM,
Morrison ainda não tinha construído suas séries mais populares
(LJA, DC UM MILHÃO, NOVOS X-MEN, GRANDES ASTROS
SUPERMAN, BATMAN, CRISE FINAL) e ainda poderia ser
classificado como um jovem iniciante.
É
de espantar que tivesse tanta liberdade… ou devemos reconhecer que,
naquele momento, o selo era realmente o lugar para o experimental? –
O EXTREMISTA, já publicado no Brasil, talvez seja uma prova disso?
OS
INVISÍVEIS: REVOLUÇÃO, PANINI COMICS, 2014, 236 páginas, R$
25.90.