Ao ler agora em 2022 a série “Booster Gold” (“Gladiador Dourado” no Brasil) de Dan Jurgens – com finais de Mike DeCarlo – me deparei com uma boa série de ação, algo de comédia e ficção e muito de “liberalismo”, afinal a ideia principal é que um criminoso arrependido (“Mas ele não tinha a índole de criminoso!”) retorna no tempo e deseja fama e dinheiro, criando a fórmula de herói patrocinado.
O Gladiador Dourado, na verdade Michael Jon Carter, é um clássico caso de “soldado da fortuna”. Era um esportista no século XXV que fazia apostas nos resultados de sua equipe. Foi banido e passou aos subempregos existentes. Passou então a ser vigia de um museu, o quê lhe deu acesso a uma “bolha do tempo” e alguns itens que permitiram criar uma identidade heroica. Decidiu ir para o passado e lá tornar-se herói sempre em busca de patrocínio para manter um estilo de vida.
Lembre de 1986 é bem próximo da 1985, ano do lançamento de “De volta para o futuro” (lançado em 03/07/1985). Gladiador Dourado nº 1, lançado em 29/10/1985, aproveitava a ideia da viagem do tempo e o sonho do dinheiro fácil.
A série começa com o personagem negociando os direitos de sua marca em uma academia exclusiva. Ele tem uma empresa (“Gold Star”) onde conta com o auxílio de um empresário, Dirk Davis, e uma secretária, Trixie – uma jovem solteira que, é claro, nutre um sentimento pelo patrão. Em vários momentos Gladiador Dourado demonstra um fascínio com riqueza, além de tentar criar uma imagem de herói e celebridade para si, sendo que na área visual chega a usar capa em alguns momentos. Somos apresentados também ao robô Skeets que é um robô guardião do museu no futuro e que servirá em muitos momentos como a consciência do herói, ainda que o Gladiador não seja em nenhum momento mesquinho ou covarde. Claro que é apenas uma interpretação do autor.
Nas duas primeiras edições são estabelecidos os vilões da série que se passa na Metropolis do presente (1985-1986). A organização “1000” – anteriormente “100” na época da série do Raio Negro – se torna a antagonista do personagem e surgem vilões como o Blackguard (edição 1), a Mindancer (2) que ora são contratados para roubar ou sequestrar, ora para enfrentar o Gladiador. Não há muita novidade neste momento, mas o fato de que o personagem tem que se preocupar com uma imagem pública e que isto afeta seus ganhos é muito interessante. “Youngblood” de Rob Liefeld também se aproveitava desta deixa de patrocínios, publicidades e exposição midiática.
Em determinado momento a justiceira “Espinho”, personagem comum em aventuras das séries do Superman, aparece na trama e o foco é a organização “1000” seus agentes, seus crimes e seu controlador – um senador americano que ao longo da série tenta incriminar o Gladiador por manobras fiscais, afinal ele não tem documentos e ninguém sabe sua origem. Esta é uma condição interessante: já conhecemos o personagem estabelecido, meses depois de sua chegada, e lentamente vamos descobrindo sua origem e os como e porquês.
A edição 6 traz a origem do personagem e a participação do Superman que se estenderia ao número seguinte. Uma boa aventura que apenas mostra a visão “romântica” que o Jurgens tinha para o personagem que é iludido em uma trama de poder em um planeta alienígena.
Neste momento surge a trama da filha do Dirk Davis
sequestrada e o dr Soo passa a um papel mais importante: ele
recebe uma verba para financiar uma pesquisa com os microcircuitos da
roupa do Gladiador e será responsável por criar uma versão
feminina que será usada pela Trixie. O Superman percebe que o Skeets
deveria saber da existência do Gladiador Dourado no passado
(ressalto: o robô trabalha em um Museu) e o questiona, ao qual
recebe uma resposta de que o herói tem sua existência registrada no
futuro – o quê o faz um paradoxo, claro – e seria esta a razão
de o robô permitir os acontecimentos.
Depois da aventura no espaço (06-07) as edições seguintes (08-09) fazem um flashback e contam a chegada no Gladiador ao presente em 20 de agosto de 1985 e como enfrentou a Legião dos Super-Heróis que foi enviada para resgatar a bolha do tempo e o anel que ele usa para voar. Esta aventura tem salvamento do presidente dos EUA (Ronald Reagan) e estabelece a ideia de que o empresário dele estava desde o início sendo alvo de chantagem – sequestraram a filha do Dirk. Michael acreditava que a LSH era uma espécie de polícia cronal e consegue convencer os heróis do século XXX que seus objetivos são honestos, talvez porque a equipe ache-o corajoso para continuar no passado e enfrentar as tragédias radiativas que viram em seguida (HEX com Jonah Hex estava sendo publicada e mostrava um futuro semelhante ao exibido em Mad Max, a cinessérie).
As edições 10 a 13 mostram um arco interessante que encerra o “primeiro ano da série”. O “Diretor” (o senador que desejava sequestrar o presidente e orquestrou as auditorias fiscais contra a empresa de Michael, além de ser “diretor” da organização “1000”) invade os bancos de dados de Skeets – o quê faria o robô atacar o herói; Dirk continua a ser chantageado e Michael se aproxima de Trixie. Na edição 11 o vilão Shockwave destrói o prédio onde fica o empreendimento de Michael – enquanto diálogos constroem a ideia de que suas rajadas de energias estão cada vez mais fracas. Trixie é sequestrada, encontra a filha de Dirk, elas são resgatadas e Trixie recebe a versão feminina da roupa de Michael, chamando agora “Gold Star” (nome da empresa e primeira escolha de Michael). Ao mesmo tempo Michael enfrenta o Diretor, que destrói Skeets e grande parte da roupa do futuro, deixando ao final da edição 12 a ideia de que o herói “poderia” ter morrido.
A edição 13 (fevereiro de 1987) se passa durante o evento “Lendas” onde a opinião pública é manipulada. Michael está hospitalizado e o hospital é invadido. Ele consegue fugir com a ajuda dos colaboradores e Dr Soo recupera parte da roupa, além de procurar a ajuda de Rip Hunter (personagem clássico da DC Comics que é um viajante do tempo e no contexto de reformulação vigente estava iniciando suas pesquisas de viagem no tempo). Assim enquanto Dirk fica organizando uma nova base no presente, Gladiador, Trixie, Soo e Hunter vão para a Gotham City do século XXV, onde Michael descobre que sua mãe faleceu e sua irmã foi despejada e que há um prêmio por sua cabeça!
A trama deste período já mostra um Jurgens preocupado em fazer tramas mais elaboradas, com consequências para o personagem, já um pouco distante da fórmula de “novo herói celebridade na cidade que enfrenta organização maligna”. Creio que vale a pena conhecer as origens do personagem que se tornaria muito popular a partir do ano seguinte (1988) quando passa a ingressar a “Liga da Justiça Internacional”. Se eu não tinha esperanças que o material tivesse alguma qualidade, fiquei surpreso.
Em breve a fase final da série.